sábado, 19 de outubro de 2013

Entrevista com Lúcio o Flávio Pinto




"Poucas coisas na vida são exatas, mas de uma coisa eu tenho certeza ninguém é unanimidade. Ao longo de nossas vidas definimos nosso caráter, nossa personalidade e vivemos de acordo com normas e princípios no qual adquirimos durante nossa vida. Entretanto, por mais sensatos que possamos ser ou parecer, definitivamente não há como agradar a todos”. (autor desconhecido)


Faço desta frase um pouco do que pude conhecer sobre Lúcio Flávio Pinto. Embora todo o seu caráter exemplar e sua ética profissional, ele é perseguido e odiado por seus adversários. Porém, apesar de não agradar este grupo, acredito que a maior parcela o considera, um dos maiores exemplos de profissional do jornalismo. Eu o conheci desta maneira. Um jornalista cuja conduta é divulgar a verdade. Em meio a tanta podridão da mídia, Lúcio Flávio Pinto se mantém limpo. Que bom que existe um jornalista como ele. Que bom que existe o jornal Pessoal. Que bom que podemos falar que ele é de Belém do Pará, um orgulho para nossa terra.


Foi em uma casa que mais parece uma biblioteca que entrevistei o Jornalista. Figura polêmica, formador de opinião. Admirado por muitos pela coragem de optar por um jornalismo integro, beneficiando a coletividade da informação. Odiado pela elite e pelos os que a defendem, como cita na entrevista. Era o que se esperava, respostas tão inteligente e ao mesmo tempo tão sábia desse jornalista, com 47 anos de carreira e quase 27 anos escrevendo o seu próprio jornal.

 Lúcio se destaca ao criar um jornal livre de qualquer envolvimento com o governo e com outras empresas; um jornal sem patrocínio. O Jornal Pessoal é livre para informar ao leitor uma verdade pura e sem filtração. Lúcio Flávio Pinto se mostrou um jornalista de um alto conhecimento e com algo essencial para uma entrevista: A sinceridade. 




Michele Lobo: O que você mais gosta de fazer?

Lúcio Flávio Pinto: Bom eu gosto de trabalhar, porque o trabalho me dar prazer, de ler e de ouvir música, são as atividades que mais me dão prazer.

Michele Lobo: Qual a sua maior qualidade e maior defeito?

Lúcio Flávio Pinto: Acho que maior qualidade é querer sempre aprender, sempre disposto a descobrir coisas novas. Maior defeito é a pressa, essa ansiedade pra fazer as coisas, que sempre compromete a perfeição.

Michele Lobo: O que deixa você com raiva?

Lúcio Flávio Pinto: Muita coisa. Mas profissionalmente é ver uma informação valiosa não está circulando na sociedade. É uma coisa que sempre me incomodou. Eu sou jornalista, sou como um instrumento, um veículo para transferir as informações que eu obtenho de valores sociais e que tenha importância coletiva para a sociedade, para que ela esteja mais rapidamente possível. Porque às vezes uma informação quando não está casada com os acontecimentos, não acompanham os acontecimentos, ela passa ser uma informação secundária. A boa informação é aquela que entra na agenda do dia do cidadão para que ele use a informação como ferramenta, que é uma arma para tomar as decisões certas.

Michele Lobo: Você tem medo de que?

Lúcio Flávio Pinto: Que o meu medo seja maior que a minha coragem. Todos nós seres humanos temos um componente de medo e um componente de coragem. Quando o componente de coragem é exagerado ai vira uma condição temerária. Quando o componente de medo é exagerado ai vira uma covardia. Então o ideal é você está bem no meio. Nos momentos de medo, mas o medo é sufocado pela coragem, e não ir à coragem até um ponto que chega ao suicídio.

Michele Lobo: Banda preferida?

Lúcio Flavio Pinto: The Beatles

Michele Lobo: Qual sua opinião sobre as drogas?

Lúcio Flavio Pinto: Acho uma droga. Todos os tipos de drogas. Eu nunca fumei, bebiam socialmente até 1991. Quando eu estava na beira da piscina, eu resolvi parar de beber. Está é uma característica da minha personalidade, tomar decisões que mudem para uma situação melhor. Eu achava que a bebida era boa, mas me fazia falar demais. Eu não gostava de falar demais. Eu tomava trinta xícaras de café por dia quando estava no auge das redações na revista Veja em São Paulo. Hoje eu tomo três. Eu acho que o caminho da vida é você procurar eliminar os defeitos que tem e aperfeiçoar as virtudes.

Michele Lobo: o que você faz para melhorar o mundo?

Lúcio Flavio Pinto: eu procuro melhorar a mim mesmo. Depois a minha vinculação ao mundo. Procuro sempre no caso do jornalismo os temas que me tornam importante para a sociedade.

Michele Lobo: O que levou você para o lado do jornalismo?

Lúcio Flavio Pinto: Eu não tive problema de vocação. Porque quando minha mãe estava grávida de mim, ela estava lendo um livro, e quando ela teve as dores do parto, ela estava na página do centurião Lúcio Flavio, meu nome deve-se ao livro. Então a minha relação com o livro era uterina. Meu pai foi jornalista, eu desde que me entendo fui jornalista, participei de jornais de escolas e com 16 anos eu entrei no jornalismo profissional. Então da mesma maneira que eu me descobrir na água aprendi nadar em Santarém antes de eu descobrir o mundo, com jornalismo eu também fui assim.

Michele Lobo: Você também é sociólogo que está formação influenciou na sua carreira profissional?

Lúcio Flávio Pinto: Eu queria ter uma noção mais ampla das conjunturas. O jornalista lido com as conjunturas, com os acontecimentos do dia a dia. Eu queria ter uma compreensão maior, então fui pra sociologia e acho que optei certo. Foi muito importante pra ter essa contextualização dos fatos.

Michele Lobo: Você deu aula em grandes universidades, atualmente ainda há interesse de exercer a profissão de professor?

Lúcio Flávio Pinto: Eu dei aula nove anos na federal; e o que eu senti muito foi que não só a atividade acadêmica e pedagógica exigia muito tempo, mas a politicagem que existe também nas faculdades do governo. Eu estava me desligando dos acontecimentos e estava cada vez mais confinado aos campos universitários. Então eu resolvi parar, porque eu estava me desatualizando. Eu gosto bastante de está em contato com as universidades, com palestras, mas exercer a profissão de professor não mais, a não ser que eu queira me desligar do jornalismo. Fazer bem o jornalismo do dia a dia e as funções de faculdade exige um desgaste enorme.

Michele Lobo: Por que deixou a grande imprensa, passando a se dedicar a um próprio jornal?

Lúcio Flávio Pinto: Várias vezes eu me batia com os patrões e com os editores em relação às matérias mais polemicas, que incomodavam com anunciantes, e eles sempre me diziam: então vai fazer um jornal, quem manda aqui é o patrão. Então eu resolvi fazer um. Eu fiz um jornal porque simplesmente eu não consegui publicar uma noticia que achava que tinha que publicar que foi o assassinado de Paulo Fonteles em 1987. Se for reparar, muitas notícias só saem no jornal pessoal, pela liberdade total. A noticia não é fornecida a sociedade por desinformação, incompetência e até mesmo a covardia dos jornalistas.

Michele Lobo: Qual a importância do reconhecimento do seu trabalho através dos seus prêmios?

Lúcio Flávio Pinto: Desde que ganhei o prêmio ESSO em 84, resolvi não ir atrás mais de prêmios. Até 84 eu ainda disputava alguns prêmios. Porque você passa ser um jornalista de prêmio. Vejo muitos jornalistas incomparavelmente mais bem premiados que eu, mas que, utilizaram uma agenda para serem premiados. E isso é uma condicionante, às vezes até uma limitação. Desde então os prêmios que eu tive foram sem correr atrás, por iniciativa de alguém. É bom por que mostra que as pessoas estão prestando atenção. Não corro mais atrás, mas se eles aparecerem e eu achar que o prêmio é merecedor de crédito, eu acho isso muito bom.

Michele Lobo: Sabendo que, o que move a grande imprensa é os patrocinadores. Como sobrevive o "jornal pessoal" desde 1987?

Lúcio Flavio Pinto: Quando eu fui para o jornal pessoal, eu tinha a principio uma ilusão. De que ele não iria durar muito. E eu queria que ele não durasse muito, por que eu sabia o que era fazer um jornal desse tipo. Seria um sacrifício enorme. Quando entrei para o jornal pessoal, pedir a demissão para "O Estadão", que em respeito aos dezoito anos que eu trabalhei ali, me deu todos os direitos. E com esse capital eu montei o jornal pessoal. O jornal pessoal fez opção pela pobreza. E eu fui me ajustando à pobreza do jornal.

Michele Lobo: Levando em consideração que você tem diversos livros dedicados à Amazônia, que envolvem vários protestos e palestras. Qual o fruto desse trabalho? Tem efeito nesse trabalho tão necessário, mesmo essa guerra sendo tão perigosa?

Lúcio Flávio Pinto: Em 1978 eu estava escrevendo um artigo para uma revista em São Paulo de arquitetura e urbanismo (TJ). Estava escrevendo um texto que falava hectares. Uma pessoa que não tem informação não vai entender qual é a área que corresponde a hectares. Ai parei e fiquei pensado e fui ver dimensões. O campo de futebol tem três dimensões oficiais, eu que o menor das dimensões era equivalente a um hectare. Ai eu escrevi em artigo de 78 que era equivalente a um campo de futebol. De lá pra cá, todo mundo utiliza isso. E tenho certeza que foi a primeira vez que alguém usou. Essa inovação foi a certeza que o jornalismo não se limita a reproduzir as coisas, esta sempre se renovando procurando novas formas de expressão para facilitar a comunicação com o público. Isso foi uma contribuição formal. Outra contribuição é que eu queria uma frase que diga o que é a Amazônia, em 72 (bem antes do hectare), ai eu disse, é um “almoxarifado” do mundo de recursos naturais. Almoxarifado do qual tudo se retira e pouco se repõe. Então passou a ser uma frase comum. Quando você tem a percepção viva da história, você viu aquele acontecimento, conhece o personagem, esteve presente nos fatos, você gera um conhecimento novo. Um conhecimento que produz uma cultura com pessoas que repetem e incorporam a interpretação. Isso pra mim tem sido o maior resultado que eu escrevo, mas sobre tudo das palestras. Provoco muitas discussões nas palestras, as pessoas me procuram, fazem-me perguntas. Ouve casos de palestra é muito importante pra mim, pelo contato direto. Uma pena que muitas das vezes o debate o tempo não permite. Prefiro ouvir o que as pessoas querem saber. O diálogo tem sido bom pra mim que testa meus conhecimentos e renova-o, e espero que para as pessoas também.

Michele Lobo: Você tem noção que o seu nome é citado na faculdade como um exemplo na profissão como você se sente sabendo disso?

Lúcio Flávio Pinto: O mundo acadêmico está cada vez mais voltado pra dentro de si. Cada vez mais preocupado com sua própria carreira. Eu vou pra dentro das faculdades sabendo que de um lado tem as pessoas que me consideram como modelo. Mas o que me interessa realmente é aqueles que ainda hoje questionam o valor da informação jornalística. E eu sou extremamente rigoroso com profissionais da imprensa, que acham que podem escrever sem segurança, sem a quantidade de informações necessárias para construí informação. Tem que ter maior rigor no jornalismo, por que às vezes é a única referencia dos fatos. Principalmente porque o mundo acadêmico se encolheu. Eu fico feliz quando eu vejo quer as pessoas se sentem estimuladas no jornalismo, considerando o que eu faço. Mas minha principal tarefa e o do embate, tanto com os poderosos quanto com aqueles que de uma forma ou de outra servem a eles.

Michele Lobo: Apesar de ser um jornalista admirado por uma grande parcela dos jornalistas. Você se considera sozinho nesta luta por um jornalismo íntegro, sem qualquer envolvimento político e comercial?

Lúcio Flávio Pinto: Não. Tem pessoas aqui e fora daqui que eu respeito muito, que tem integridade, mesmo dentro de uma grande empresa. Porque também é uma ilusão, achar: "porque estou dentro de uma grande empresa não posso fazer nada". Às vezes isso ai é um "habeas corpus" preventivo para pessoa não fazer nada. Eu por exemplo. Trabalhava no "O Liberal", e não podia falar mal do governador que era apoiado pelo jornal. E eu tinha uma matéria contra o governador que denunciava corrupção no governo dele. Eu adotei uma tática. Pedir para o editor do jornal deixa uma pagina de domingo pra eu fazer minha matéria e entreguei no ultimo momento (alegando que tinha uma matéria bombástica), pois, o jornal de domingo tem mais assunto e por isso é antecipado. E sumir (risos). No dia seguinte a bomba estourou, mas já estava tudo feito. O que me dá é o seguinte: É verdade? Eu publico. Eu posso provar? Então eu publico. Se eu não tenho segurança na verdade e se eu não posso provar, então eu não publico.

Michele Lobo: Você acredita que a grande imprensa, um dia, possa voltar a seus padrões éticos?

Lúcio Flávio Pinto: Não. Acho que melhorou em certos aspectos, mas nos padrões que um dia tivemos nunca melhorou. Tem uma democracia falha, em que alguns têm uma capacidade de manipulação muito maior do que a sociedade pode prevenir. É uma democracia limitada pelo dinheiro. Na época da ditadura no AI5 começa a ditadura pra valer, ai começa a censura à imprensa, nas redações e nessa época terrível ninguém pode ter ditadura nas redações. Mas ao mesmo tempo as pessoas eram mais dignas, pois nos sabíamos quem era o inimigo. Hoje o inimigo janta com agente. Autocensura é a compra. Pessoas que recebem mais pra ficar calado, várias formas de sedução. Hoje a autocensura é uma praga. Hoje o jornalista não quer saber se o patrão vai impedir ou não, ele não quer se expor. Se você se deixa vender, é porque você quer se vender. Eu não tenho problema em ser honesto, eu sou honesto.

Michele Lobo: O jornal pessoal tem um espaço dado ao leito. Tanto os que concordam com o que você diz, e os que não. Qual a sensação de receber uma carta completamente ofensiva e ter que publicar?

Lúcio Flávio Pinto: eu poderia não publicar. A carta mais ofensiva foi mandada pelo Hélio Gueiros (três meses depois que ele deixou o governo). A carta começa com o palavrão mais horrível que se pode ter, e termina com o mesmo palavrão horroroso. Foi um impacto enorme. Na época eu quis cobrar pessoalmente, e tentei três vezes e felizmente não aconteceu. Mas eu publiquei, por que eu posso contraditar tudo. Se eu tiver errado, eu digo estou errado, mas pra me ofender, pra mim é muito fácil me defender. Na hora você sente um impacto enorme, é naquela hora que você ver se é covarde ou não. Felizmente em tudo que já passei eu nunca me comportei como uma pessoa covarde seja ao escrever, ou seja, ao me expor publicamente nas ruas. Não sou o mais corajoso dos homens, é por isso que eu vivo. Tenho integridade, e não abro mão disso. Não baixo o nível. Ninguém nunca viu escrever sobre a vida intima dos Maioranas. E eu poderia escrever. Mas quero saber o que se implica na vida da sociedade. Então publico cartas de quem me ofendem sem problema. Minha vida é aberta, pode dizer o que quiser não tenho nada o que esconder. O que eu falo e o que eu digo, é o que eu faço.

Michele Lobo: um acontecimento bem atual é belo monte. O que você tem a dizer sobre isso?

Lúcio Flávio Pinto: eu acompanho belo monte desde o inicio. A história de Belo Monte começou em 1975. O grande problema é como a sociedade pode acompanhar esses projetos, antes durante e depois. Há uma desinformação total, mesmo aqueles grupos que tomam atitudes. Não se conhece totalmente o problema da energia, porque ninguém dar atenção. É muito fácil ser contra ou ser a favor. Você só pode dizer que é contra ou a favor, se conhecer. O grande problema é que os grandes projetos vêm de fora pra dentro, se implantam com um único objetivo. Jogar as riquezas naturais para fora. Amazônia é o grande “almoxarifado” de energia do mundo. Os grandes investimentos no Brasil são feitos par atenderem interesses particulares e não coletivo. E a maioria de quem é a favor ou contra não conhece belo monte.

Michele Lobo: quais são os seus projetos para o futuro?

Lúcio Flávio Pinto: é continuar produzindo e escrevendo. Escrever enquanto estiver com consciência e  lucidez. Poderia ter três vidas iguais a essa e não terminaria nunca.

Michele Lobo: diga uma frase preferida para finalizar

Lúcio Flávio Pinto: eu tenho um lema da minha vida é de um grande poeta alemão – “não fazer mal a ninguém nem a si também. Eis o bem”.

Foi uma honra entrevistar pessoalmente o melhor jornalista do norte, meu exemplo como profissional.




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