terça-feira, 30 de outubro de 2018

Mulher e a cobrança do corpo perfeito



Foto antiga com edição (haha)

Para falar da cobrança por um corpo perfeito para  nós mulheres é preciso entender que há um processo social que nem percebemos. Vamos lá. Segue minha experiência:

Lembro dos anos 90, eu pirralhinha...Já via, nos programas de TV um padrão de "corpo perfeito".

Via as dançarinas do Faustão e do Gugu, todas com corpos "perfeitos expostos". Lembro da banheira do Gugu, que era nada mais que uma propaganda para a Playboy (Depois que descobri, tá? Tipo, atualmente).

Ahh, os anos 90(os meus anos 90 em diante). Lembro das personagens Feiticeira e Tiazinha e a febre das duas nessa geração. Dos chicletes infantis com as figurinhas de adesivo com suas fotos seminuas. Meu amigos, irmãos, coleguinhas, eu (as crianças da época) comprávamos.

Era a sensação. Foi um estouro, uma febre...As dançarinas, as assistentes de palco, as atrizes, grupos musicais como o É o Tchan. Mulheres tendo seus corpos como produto. Homens consumindo e toda uma geração de pessoas insatisfeitas.

Filmes e novelas não fogem desse contexto, em que a sexualidade feminina está sempre por lá. Pouco  coisa mudou, os programas de televisão continuam com essas exposições. 

Onde quero chegar lembrando desse período dos anos 90, e dos dias atuais?

Quero chegar na cobrança/tortura que mulheres passaram/passam desde sua adolescência até sua vida adulta. Quero chegar nos meninos/homens que desde pequenos idealizaram um corpo que não existe. São corpos com silicone, com cirurgias, com vários procedimentos estéticos.

São corpos ajeitados em programas de edição de imagens. É a celite que se tira aqui, estria que se tira ali. E por mais que essas moças consigam o padrão do corpão perfeito, nós sabemos dos sacrifícios para isso.

Aqueles meninos que viam/vêem esses programas, revistas de mulheres peladas, pornografia, são homens hoje. São homens que em muitas situações (não são todos, ok?) esperam ou procuram uma mulher com esse padrão...

Quando casam ou possuem qualquer tipo de compromisso, em alguns casos traem e não se contentam com apenas uma.

Nunca então satisfeitos.

Meninos que fazem mulheres sofrerem por causa de uma sociedade que cobra de mulheres um preço alto demais. Uma sociedade em que empresas usam corpos de mulheres como produtos e massacram todas as outras.

Essa é a realidade: corpos de mulheres como produtos, homens exigentes e mulheres sofrendo com seus corpos.

Eu sou uma dessas mulheres, que sempre fui inconformada com meu corpo, sempre comparando com os outros.  Muitas de nós somos essas mulheres que passamos nossa adolescência odiando nossos corpos. Odiando nossa aparência.

Era época que cabelo cacheado/crespo era ruim, e a febre dos alisamentos. E tantos outros padrões impostos e aceitos.

Ah, mas essa época passou. Não. Não passou. Estamos sofrendo as consequências dessa época. São meninas se matando em academia. Mulheres morrendo em clínicas de estética...Nessa busca desenfreada pelo corpo perfeito.

Vejam que não estou falando de saúde, vaidade e cuidado, isso é bem-vindo a todas nós. Ou de homens que admiram a beleza de outras mulheres sem maldade...

Não.

Eu estou falando do martírio. Estou falando de depressão. Estou falando de vários vícios, como a pornografia masculina. Estou falando de um mau comum (Para homens e mulheres).

Estou falando das conversas de homens que quase sempre envolve o corpo feminino...

Do quantos os próprios homens cobram dos outros "masculinidade", pois tem que falar de mulher. São rotinas, comportamentos tão comuns que nem percebemos. Não nos damos conta, pois não falamos sobre isso.

Algumas mulheres do movimento feministas protestam sem roupa. Os comentários em fotos desse tipo são: bando de barangas de peitos caídos. Se é uma forma ruim de protesto ou não, nem vem ao caso em minha análise desse assunto. Mas sim sobre todo um padrão de corpo feminino perfeito idealizado pela sociedade.


Converso bastante sobre isso com meu marido. Ele me apoia com todas minhas revoltas. E falamos sobre beleza.

Ele sabe de todo meu sofrimento com minha aparência e de minhas inseguranças ao longo dos anos. Ele teve que lidar com isso. Hoje pessoas chegam com ele e falam negativamente sobre eu ser Feminista. Mas só ele sabe o quanto isso tem feito bem pra mim, só ele sabe de todas minhas crises e sofrimentos por me sentir feia, inferior.
Muitos não entendem do meu marido  apoiar meu lado político/social e no movimento feminista. Mas convivemos há quase 15 anos. E realmente estou em uma fase de mudanças e aceitação. 

Se olhar no espelho e se comparar com outras pessoas é complicado demais. Não viramos confiantes da noite para o dia. É um processo lento e doloroso.

Tenho muitas recaídas. Recentemente descobri que tenho vitiligo. É uma doença autoimune, que afeta a melanina do corpo. Doenças autoimunes na maioria das vezes são geradas por problemas emocionais: eu passei por problemas familiares fortes demais, talvez seja isso.

Mas a questão é que o vitiligo muda a cor da pele, e já avançou um pouco. A ansiedade também fez com que ganhasse uns quilinhos. Uns 14 quilos depois que casei. As esposas dos amigos do meu marido são magrinhas....E lá vamos nós do início. Lá vamos nós recair e recomeçar o processo de aceitação. E não é fácil. Não é fácil porque o sistema em que vivemos é cheio de cobranças.

 É um processo louco e hoje estou melhor. Quero apenas cuidar da minha saúde emocional e física. Se for pra emagrecer não é pra agradar quem me chama de gorda ou porca (como me chamaram esse ano), mas sim por mim.

É uma loucura toda essa questão de padronização da beleza feminina. Gera a rivalidade feminina. Gera complexos e tantos outros sintomas maléficos para nossa sociedade. E o que acho interessante sobre isso é que são comportamentos camuflados. Pouco ou quase nada se fala. Não temos força nem coragem para isso. Essa camuflagem durou anos....Mas:

A internet veio e estou até sem palavras pra falar do quanto ela alvoroçou esse assunto e tantos outros. Bora falar, se ajudar, elogiar a amiga que está se sentindo feia e pra baixo. 

Para terminar essa minha reflexão que rende um livro 😅:

Almejo que nós mulheres encontremos beleza em nós mesmas.

Espero que todo esse padrão seja, mesmo que lentamente despadronizado...

Não só pelas mulheres, mas pelos homens também.

Que cada uma possa encontrar beleza (que não tem padrão) no que é comum.

Só assim haverá relacionamentos mais saudáveis. Não só relacionamentos, mas pessoas mais saudáveis.

Se ame. Se cuide.

Por: Michele Lobo

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