Por: Michele Lobo
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O mestre Eugênio, como é chamado, faz parte de um dos primeiros processos das joias paraenses, a matéria prima. Ele dá
formas geniais em braceletes, anéis, brincos e colares. Usa a madeira, chifre e
osso de boi. Começou a trabalhar no artesanato de joias há dezesseis anos. É
artesão, escultor e faz acessórios de moda. O mercado de luxo de vários
outros países conhece suas peças, mesmo sem imaginar do lugar em que ela é feita.
O Mestre Eugênio é peça fundamental da criação das joias paraense. Se orgulha de onde vem e o que representa na cadeia produtiva. Foto: Michele Lobo |
Chuva, rua deserta, perigo, medo, ansiedade. Meus passos eram apressados. Afinal, as orientações eram: “Vem pela manhã, pois à tarde, depois da chuva é perigoso”. Não contava com uma manhã chuvosa. O bairro é o Tenoné, periferia de Belém. A Rua São José Ribamar, sem saneamento, em época de chuva, muita lama. De longe, avistei uma senhora na esquina sorrindo. “Você está procurando pelo Eugênio?”. Era esposa do entrevistado, Edileuza Pinto, com quem marcamos entrevista. Seu Eugênio tem uma ótima assessora. Respondi que sim, agradecendo, claro, por me esperar na esquina. Ela estava preocupada, pois estava chovendo e eu desconhecia o lugar. Perguntei se podia bater foto da rua. “Não, guarda é perigoso”, contestou. A frente da sua casa era diferenciada, com plantas, parede ainda não rebocada, portão de madeira. Já sabia que havia animais. Afinal, antes por telefone, não tinha como não escutar o galo cantando. Se esgoelando. Edileuza entra na frente para ver se o cachorro estava preso, então chega o entrevistado.
O mestre Eugênio trabalha na ofinica improvisada da sua casa. Foto: Michele Lobo |
Faz esculturas desde adolescente e sobrevive apenas do artesanato. No momento, especialmente das biojoias, terceirizando seu trabalho para a maioria dos Designs do Projeto do Polo Joalheiro, no São José Liberto. “Não pretendo ter outro tipo de trabalho, gosto do que faço”, afirma. E não houve dúvidas sobre essa afirmação. Expressava orgulho em todas as suas obras que mostrava. Fazia questão de exibir e explicar suas criações. Sua esposa ajuda no acabamento, juntamente com Adilson, que trabalha todo dia com ele.
O mestre Eugênio dá forma às matérias-primas, desenha e pinta. Um verdadeiro artista. Durante a entrevista, conheci um pouco de todos os seus trabalhos. Até um álbum de fotografias de suas peças ele me apresentou. Sensacional. Não tem como não admirar o diferencial das sua peças e de certa forma sentir orgulho, por ser um artista paraense.
Ao entrar em sua casa, conheci sua oficina, tive um choque de realidade. Deparei-me com uma oficina de estrutura mal acabada. A princípio quase uma casa abandonada. Duas tábuas ajudam atravessar para chegar a uma das partes da sua oficina. Quando chove tudo vira lama. Há uma mistura entre sua oficina e seu quintal. Comentei que ele tinha até tartaruga. “É jabuti”, corrigiu. Ele gosta do seu espaço, da natureza, já morou em São Braz. Não pretende mudar de endereço, não gosta de ir para o centro. Geralmente seus clientes que o procuram. Percebi na conversa uma autovalorização pelo seu trabalho, se orgulha do que faz e sabe da sua importância nas peças. Apesar de poucos conhecerem seu nome. Ele sabe muito bem quem é. Gosta do seu ambiente, do seu trabalho, da sua casa. Seu amor torna sua peças indispensáveis para a construção das joias.
Continuei fazendo aquela observação do espaço. A área de serviços ainda é das antigas, o antigo giral com panelas, o tanque, o chão bruto, com a chuva vira um lamaçal, galinhas por todos os lados e árvores. Do outro lado é uma espécie de depósito. De lá ele vinha com várias peças para me mostrar. Ele entende, sabe onde está peça a peça. A cada parada para admirar seu trabalho, seu Eugênio respondia minhas perguntas. Seu Eugêncio é um grande conhecedor naquilo que faz, tem a prática, anos de experiência peça fundamental, assim como um designer, ourives ou qualquer outro que faça parte da produção de uma biojoia.
“Logo que comecei com as biojoias, a Xuxa no seu auge usou uma pulseira minha, abriu a boca dizendo que comprou na França, mal sabe da onde veio. Made in Tenoné, brincou”. O artesanato de Eugênio conquistou o conceituado estilista francês Yves Saint Laurent, que sempre fazia encomendas e vendia para classe alta. Após seu falecimento sua empresa não entrou mais em contato com ele.
Percebi com a história de seu Eugênio, o quanto nossos artistas são esquecidos por nós mesmos. Seu trabalho percorreu e ainda percorre o mundo. A valorização de um produto na maioria das vezes é dada para os conceituados de fora. É uma inspiração a história de simplicidade de um artesão que ama o que faz. É pé no chão. Sabe como as transações do mercado funcionam. O que deixava irritado, hoje não deixa mais. Eugênio de Oliveira. Grava esse nome. Mestre do artesanato. Cria peças que sai de Belém do Pará, precisamente do bairro do Tenoné, para o mundo.
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